segunda-feira, 5 de maio de 2008

Moscou

Promessa feita é promessa cumprida.

Eu mesmo havia prometido continuar esse blog depois que voltasse para o Brasil, mas inúmeros fatores (entre eles a preguiça e o ócio não-criativo) me impediram de honrar a minha palavra até o dia de hoje, quando resolvi tirar a bunda do pudim e voltar à ralação.

Provavelmente vocês deverão estar se perguntando sobre o motivo pelo qual o blog ficou parado tanto tempo. Ou provavelmente não, já que a maioria dos leitores do blog são amigos ou parentes próximos que já ficaram sabendo do ocorrido. Mas vale a pena registrar: o negócio é que roubaram o laptop da Bela em Milão, e sem computador ficou difícil arrumar tempo pra escrever todo dia durante a viagem.

Além da falta de tempo, perdemos todas as fotos. E isso, aliado com o fato de que já se passaram quase 6 meses desde o término da viagem, vai acabar alterando o modo que eu utilizava para contar as nossas impressões dos passeios. Agora, vou deixar de narrar o que passou com a gente hora por hora pra fazer mais um relato das coisas que nos marcaram de um jeito mais geral, onde o que vale mais não é o acontecimento em si, mas a nossa lembrança do que foi único e extraordinário em cada cidade pela qual passamos.

Então vamos começar de onde paramos: Moscou. Como a última cidade que visitamos, Moscou também fica na Rússia. É, de fato, a capital da Rússia. Fomos pra lá de trem, um trem noturno que saía de São Petersburgo umas 11 da noite e chegava lá às 6 da manhã.

Vale a pena relatar nosso calvário para comprar os bilhetes do comboio. Como ninguém falava inglês na Rússia (e depois de três dias já sabíamos disso o suficiente para nem cogitar a possibilidade de haver um intérprete na estação de trem), chegamos no saguão da bilheteria sem saber o que fazer. Por sorte, havia ali um pequeno computador que os passageiros utilizavam para comprar ingressos ou fazer consulta de horários. A parte ruim é que não havia tradução (d'oh), era tudo em russo e em alfabeto cirílico. Assim, tentamos adivinhar mais ou menos qual opção significa partidas, tentamos decifrar qual campo era o horário e como se escrevia Moscou e São Petersburgo em cirícilo e voilá!, chegamos numa lista com várias opções de horários.

Daí só anotamos "ST. PETERSBURG (isso em cirílico é bizarro! nem tentamos) --> MOCKBA 23:00" num papelzinho e entregamos para a mulher do caixa. Fiz o sinal de dois com a mão indicando que éramos dois passageiros, ela fez as contas e virou pra nós o visor da caixa registradora, registrando alguns milhares de rublos. O valor parecia um pouco exagerado (cerca de 40 dólares por pessoa), mas não podíamos fazer nada. Pagamos e recebemos o bilhete. Daí voltamos ao hostel e perguntamos à recepcionista (que falava porcamente a língua anglo-saxã) qual era o vagão do trem e os assentos e ela nos explicou que havíamos comprado bilhetes para um trem-dormitório, e por isso eles foram mais caros. Mas no final das contas até que valeu a pena, pois li depois que trens na Rússia, especialmente os noturnos, são perigosíssimos. Além do mais, ainda não tínhamos tido (e nem tivemos depois) a oportunidade de viajar num vagão leito. Só pra constar: foi ótimo, muito confortável.

Chegamos em Moscou assim, cedinho e descansados. Para nossa surpresa, não havia neve; parece que havia nevado quando pousamos na cidade antes de ir pra São Petersburgo mas a neve já havia derretido. Saindo do trem, já encontramos a nossa anfitriã: a Tânia.

Tânia e Luigi (o chefe italiano da OMS) numa viagem de negócios à Suíça, no natal de 2007 (foto enviada à mim por e-mail)

Bom, a Tânia na verdade se chama Tatiana, ou Татьяна Колпакова no bom e velho russo. Tivemos contato com ela graças à minha mãe, que viajou para a Rússia com um grupo de intercambistas e ficou hospedada na casa dela em Nizhniy Novgorod, uma cidade grande e relativamente importante a leste de Moscou.

A Tânia é médica, e foi chamada pra trabalhar na sucursal russa da Organização Mundial da Saúde, sediada em Moscou. Por isso mudou pra lá, e morava num pequeno apartamento de um quarto só no subúrbio da cidade. Começamos a conhecer a hospitalidade do povo eslavo por aí: enquanto estivéssemos lá, ela iria dormir na casa de uma amiga e deixar sua única cama pra eu e a Bela dormirmos. Legal, né?

Bom, nos reconhecemos sem maiores problemas e fomos pegar o bondinho até a casa dela. Pelo caminho, ela foi nos contando coisas sobre a Rússia, sobre Moscou e sobre ela mesma. Nos mostrou, por exemplo, um dos vários prédios gigantescos no estilo Empire State construídos no regime comunista para abrigar órgãos estatais como a Universidade de Moscou, por exemplo. De acordo com a Tânia, o único fora da Rússia estava na Polônia, e foi um presente de Stálin ao povo polonês. Acabamos conhecendo esse prédio quando estávamos lá, mas isso é conversa pra depois.

Por coincidência, havia uma linha que passava em frente da estação de trem que estávamos (são umas quatro em Moscou inteira, se não me engano) e que nos deixou a três quarteirões do apartamento. Era um típico conjunto habitacional da época comunista, sem graça nenhuma. O hall de entrada estava meio sujo e mal cuidado, exatamente como minha mãe havia me contado (segundo ela, não existem síndicos ou zeladores na Rússia pós-soviética). Mas o que nos impressionou mesmo foi o apartamento: pequeniníssimo, completamente bagunçado e muito empoeirado para os padrões brasileiros de limpeza.

Ele consistia num pequeno corredor que dava acesso ao quarto de dormir à esquerda, que era razoalvemente grande. Dentro, havia uma série de armários, livros empoeirados, uma televisão antiga e um sofá velho (que depois ficamos sabendo que era também a cama, pois ele se desdobrava). Uma das paredes estava coberta por jornais em inglês da comunidade estrangeira residente em Moscou. Do outro lado do corredor, ficava um pequeno depósito de muvuca, fechado por uma cortina de chuveiro. Numa outra ocasião, sem a presença da anfitriã, fui bisbilhotar o que havia lá dentro e fiquei abismado: era muita, muita tralha que parecia estar ali a séculos. Depois fui perguntar pra ela, e ela me disse que quando alugou o apartamento isso tudo já estava lá dentro, e ela simplesmente não se deu ao trabalho de tirar. Estranho, né?

Logo após o depósito ficava o banheiro. Essa parte era fenomenal: o banheiro não passava de uma pia quase descolada da parede, uma privada sem tampa e uma banheira simplíssima que fora colocada ali sem cerimônia alguma. Nos cantos, vários baldes, panos, roupas velhas, sacos de lixo, jornais antigos e tudo quanto é tralha que se pode esperar encontrar num banheiro russo. O mais impressionante era o sistema de aquecimento de água: acoplado com o chuveiro, ficava uma caixinha que possuía uma pequena chama que ficava ligada o dia inteiro. Quando quiséssemos tomar banho, tínhamos que aumentar o nível do gás o suficiente pra esquentar a água, mas tínhamos que ser extremamente cuidadosos pra não apagar essa chaminha de modo algum; caso contrário, o gás iria escapar e bum!, já se era o apartamento. Uma explosão simples assim.

A cozinha era no estilo do banheiro: azulejos antigos e sujos, empoeirada nas beiradas, sem nenhum acabamento e cheio de tralha velha. Mas lembro de ter passado uns bons momentos ali. Quando chegamos lá pela primeira vez, por exemplo, passamos uma espécie de loja de conveniência logo embaixo do prédio da Tânia para comprar as coisas para o nosso café da manhã. Daí, sempre que eu e a Bela voltávamos do passeio, nós comprávamos nessa lojinha um tanto de "blinis" congeladas (uma espécie de panqueca russa, muito boa) e esquentávamos uma
penca na frigideira, e comíamos junto com suco, iogurte e chocolate, muito chocolate. Esse último, pra falar a verdade, é pra mim a maior iguaria que encontrei na Rússia. Era bem barato e o gosto era simplesmente maravilhoso. Havia centenas de tipos e marcas diferentes mesmo no menor dos mercados e as embalagens eram maravilhosas.

O chocolate do neném era um dos favoritos. A Bela até trouxe uma embalagem igualzinha essa de lembrança! (foto da internet)


Ficamos lá três dias. No primeiro, fizemos o básico: fomos ao Kremlin, à Praça Vermelha, entramos na Igreja de São Basílio, passeamos pelas igrejas do centro, fomos na porta do Balé Bolshoi (estava em reformas, blé), passamos aperto na hora de comer, etc. Uma grande dificuldade foi comprar água: eu sempre comprava água com gás ao invés de natural, não sei porque! Mas no final das contas sobrevivemos até a hora do jantar com a Tânia, que saía do trabalho lá pelas 6. Ela nos levou pelas ruas de artistas de rua malucos de Moscou, a velha e a nova "Arbat", até um restaurante bem simpático chamado My-My, que em russo lê-se Mu-Mu, como o barulho de uma vaca. Esse rango foi completamente sensacional: comemos "borsch"(uma sopa tradicional de beterraba), blinis, saladas, bifes, doces, etc. Saiu até meio carinho (tipo 10 dólares por cabeça), mas valeu muito a pena. Talvez tenha sido o melhor rango desde o macarrão da amiga da Gabi em Londres.

A catedral de São Basílio na Praça Vermelha, que já tinha esse nome muito antes da URSS (foto da internet)

No segundo dia, conhecemos a Stella. É ela a amiga da Tânia que a estava hospedando enquanto dormíamos no seu sofá-cama. Ela também é médica, e contou pra gente que morou na Rússia até o término do regime comunista. Quando isso aconteceu, todos os médicos que antes trabalhavam pro Estado simplesmente pararam de receber, mas ninguém queria pagar pelas consultas. Pouco a pouco o novo governo foi separando verbas para o pagamento dos salários dos médicos, mas parece que aquela época foi muito difícil para todo mundo que trabalhava no sistema de saúde (até hoje o médico russo ganha muito pouco, e quase não existem clínicas particulares).

Por isso, vários médicos como a própria Stella acabaram abandonando o país e indo se refugiar nos Estados Unidos. Ela chegou em Nova York com a filha e o esposo em 1992, e no começo trabalhava entregando jornais enquanto o marido (também médico) exercia um outro tipo de sub-emprego. Com o tempo, eles foram aprendendo a língua inglesa e acabaram muito bem empregados; ela, por exemplo, virou pesquisadora de medicina em uma universidade fodástica em Nova York mesmo. Depois de um bom tempo, eles juntaram um dinheiro e resolveram voltar para Moscou.

Ela havia chegado há menos de uma semana quando nós nos conhecemos. Os planos eram nós quatro (eu, Bela, Tânia e Stella) irmos para Sergiev Posad, uma pequena cidade a uns 100 km de Moscou que é o centro do cristianismo ortodoxo russo, como se fosse o Vaticano deles. Eu e a Bela pegamos um bondinho perto da casa da Tânia até a estação de metrô e de lá fomos até o centro, e encontramos as duas na frente da estação de trem.

A Stella estava bem quieta no começo, ao contrário da Tânia que falava muito e era extremamente agitada. Mesmo morando nos Estados Unidos por mais de 15 anos, parecia que a Stella tinha um pouco de vergonha de falar inglês, e a Tãnia ficava fazendo piadinhas o tempo inteiro pedindo pra ela tentar conversar com a gente. Foi bem divertido viajar com essas duas. Uma situação engraçada foi quando o cobrador veio checar os bilhetes. Estávamos os quatro conversando e havia uma mulher sentada no mesmo banco que nós, dormindo encostada na janela. O cobrador chamou a mulher uma vez em voz alta, e, não havendo resposta, simplesmente deu um cutucão brutalíssimo na coitada e gritou no ouvido dela algo como "O BILHETE POR FAVOR!!". Ela acordou assustadíssima, e deu pra ver que faltava pelo menos uns 5 dentes nas arcadas da frente. Ficamos meio de cara com a falta de noção do trocador e com dó da pobre mulher, mas de repente a Tânia começou a rir muito alto olhando pra mulher e a Stella também. Daí a própria mulher - que chegou a ficar pálida de susto - começou a rachar, e o cobrador também entrou nessa. Daí ficaram os quatro rindo e conversando em russo, e eu achei aquilo o máximo.

Isso foi uma das coisas que me deixou impressionado na Rússia. A simplicidade desse povo é fenomenal. Lembro de várias vezes que a Tânia entrava no metrô e haviam três lugares vagos mas separados por uma pessoa que estava sentada entre deles. Óbvio que a gente não entendia o que a Tânia falava, mas a impressão era que ela simplesmente virava pra pessoa e dizia: "Ou, arreda aí porque a gente quer sentar", sem a menor cerimônia. E a pessoa simplesmente arredava sem fazer cara feia nem nada. A Tãnia fazia isso mesmo até com a gente, ficava dando pequenas ordens assim ao invés de perguntar o que a gente queria fazer. Era bem estranho, principalmente para nós brasileiros acostumados a "com licença, por favor, obrigado" e etc. Mas a simplicidade e a falta de hostilidade no jeito dela acabava sendo tão natural que eu não via problema nenhum no seu modo de agir.

Em Sergiev Posad, a Tânia comprou um mapa e alugou uma guia bilíngue que fez o passeio com a gente em inglês. Ela ia explicando igreja por igreja, mas estava extremamente difícil entender o que ela falava porque sua pronúncia era horrível! Parece que ela falava um inglês bem porco, mas decorou um texto gigantesco e ia simplesmente tentando repetir o que ela havia decorado sem saber pronunciar nada direito. Mas mesmo assim foi bem legal. Aquele conjunto de igrejas brancas com os domos em forma de cebola douradas é incrível, muito bonito mesmo. E ainda assistimos uns 20 minutos de missa que a Stella e a Tânia fizeram questão (lá eles assistem só um pedacinho da missa e vão embora, ninguém fica para o culto todo que demora mais de 3 horas), e foi tão maravilhoso quanto a primeira vez que vimos essa cerimônia em São Petersburgo.

A Igreja da Assunção, em Sergiev Posad (foto da internet)

Durante o passeio, a Stella e a guia ficaram conversando por um tempaço. Depois a Tânia veio rindo nos contar que as duas estiveram lembrando de como a vida era boa no tempo do comunismo e como hoje tudo havia piorado tanto. Fomos perguntar pra Stella se ela achava isso mesmo e ela nos explicou que existem coisas boas nos dois regimes e que ela não saberia dizer qual é melhor, mas que certamente havia muita coisa que piorou bastante da época delas pra época de hoje. Logo depois a Stella olhou para um grupo de crianças, alguns com máquinas digitais e iPods, bem do lado de várias vovózinhas rezando e sacerdotes cantando e comentou que pra ela a maior diferença entre os russos e os americanos estavam nas gerações antigas, porque as mais novas eram iguais nos dois países.

Na hora do lanche, fomos para uma lanchonete e pedimos dois salgados. A Tânia perguntou se queríamos chá ou café e respondemos não queríamos nada. Ela insistiu como se não tivesse entendido a nossa resposta - acho que pros russos é impossível não querer beber nada quente na hora do lanche. Então respondemos café. Ela nos trouxe dois chás - é incrível essa mania que o povo eslavo tem de tomar chá. Isso foi engraçado também na Polônia e em Madrid, mas isso é papo pra depois também.

Jantamos lá em Sergiev Posad mesmo, e o jantar estava fenomenal. Foi também um pouco caro, tipo 500 rublos (20 dólares) para os dois, mas valeu a pena com certeza. Dentro do restaurante estava rolando um casamento, e me lembrei de que minha mãe havia me dito que na Rússia a gente vê casamento em tudo quanto é lugar. Nós mesmos já havíamos visto dois em São Petersburgo e um em Sergiev Posad. Dentro do restaurante, todo mundo estava fumando - lá até pouco tempo era liberado até fumar dentro de aviões. Isso foi um pouco desagradável, mas o rango tava tão bom (a sopa, principalmente) que nem nos incomodamos.

No terceiro dia, voltamos à Praça Vermelha pela manhã com a Tânia para tirarmos fotos do lugar (que eu acidentalmente apaguei durante o passeio de Serguiev Posad) e fazermos o passeio turístico mais legal de todos: ver o cadáver mumificado de Lenin no mausóleu. Pra isso tivemos que pegar uma fila de cerca de 50 pessoas, praticamente todos turistas estrangeiros. A Tânia nos contou que ela havia entrado no mausoléu apenas uma vez numa excursão da escola. Ela veio de Nizhniy Novgorod só pra isso e teve que entrar numa fila gigantesca de mais de 200 pessoas às 5 horas da manhã num dia de inverno de Moscou e esperar por horas até poder entrar pra ver o Lenin.

Nós também o vimos. Ele parece um boneco de borracha e é minúsculo. Lá dentro não pode parar de andar por um instante sequer (a Bela ganhou um xingo em russo por causa disso) e muito menos tirar fotos. Na saída, existe uma espécie de cemitério das personalidades comunistas, onde estão enterradas figuras como o astronauta Yuri Gagarin, o americano John Reed e o próprio Joseph Stálin. A Tânia ficou explicando tumba por tumba, e era impressionante o quanto ela sabia sobre a história do país dela.

Vladimir Ilyich Lenin, como ainda pode ser visto em seu mausoléu na Praça Vermelha, em Moscou (foto da internet)

À tarde, fomos passear em um castelo/parque recém inaugurado chamado Tsaritsino. A história desse lugar é o seguinte: a czarina Catarnia, a Grande, mandou seu arquiteto projetar um palácio pra ela em Moscou (na época, a sede do Império Russo era em São Petersburgo). O cara demorou uns 30 anos pra terminar a obra, mas a imperatriz viu e não gostou; mandou demolir tudo. Depois disso, o terreno ficou abandonado por uns 70 anos até que um outro arquiteto planejou um novo palácio e começou a construção, mas o projeto acabou sendo abandonado no meio do caminho. O governo russo retomou as obras na década de 90 e terminou a construção no ano passado, fazendo do palácio um grande museu.

O passeio foi bem legal, já que o parque era maravilhoso e o castelo também. O grande problema era que não havia nada, absolutamente nada em inglês. Toda as placas estavam somente em russo e a guia que a Tânia contratou para explicar as coisas pra nós não falava outra língua. Daí elas tentaram meio que traduzir para nós pouco a pouco o que ela dizia, mas foi meio complicado. Mas mesmo assim gostamos.

Depois do passeio, fomos para a casa da Stella conhecer sua filha e lanchar. Chegando lá, ficamos de cara! O prédio era moderníssimo, fazia parte de um conjunto de quatro prédios em formato cilíndrico, tinha várias luzes brilhantes que mudavam de cor e uns 50 andares. O contraste com o prédio da Tânia era bizarro, e isso nos levou a pensar que quem tem grana na Rússia deve viver muito bem. A filha dela era bem legal também; ela falava inglês fluente pois foi criada bilíngue nos EUA, e ficamos conversando sobre futebol, cultura americana e países bizarros que elas já haviam visitado (como Turcomenistão e Cazaquistão, países da ex-URSS).

O lanche foi um pouco engraçado. No primeiro dia que estávamos lá, a Tânia comentou comigo que minha mãe havia amado as melancias da Rússia (watermelons, em inglês). Daí eu comentei que também gostava muito de melancia. Acontece que o que ela queria dizer era apenas melons (ou melões, em português), e eu não gosto nem um pouco de melão. A Bela, então, simplesmente odeia, não consegue nem comer. Mas a gente só foi entender esse mal entendido depois que a Tânia chega com um melão gigantesco, que dava pra alimentar uma família de 10 pessoas. Eu fiquei meio sem graça de falar que não gostava, e acabei forçando pra comer meus dois pedaços. A Bela deu umas mordidas com muito esforço, mas eu acabei tendo que comer as duas fatias dela. Mas quando eu pensava que o pior já havia passado, a Tânia cortou mais um pedaço pra cada e botou no nosso prato. A gente falou que não queria, mas o jeito mandão russo da Tânia é imbatível. Eu ainda comi o meu, mas a Bela simplesmente desistiu e deixou pra lá.

A nossa última noite foi também bem maluca. Como a gente ia sair de manhã bem cedinho, a Tânia decidiu que iria dormir junto com a gente na casa dela pra poder nos levar até o aeroporto de manhã, já que ela não confiava na nossa habilidade de achar o aeroporto numa cidade onde todas as placas estão em cirílico. O problema era que lá só tinha uma cama, e acho que no final das contas nós três iríamos dormir juntos, no tradicional sofázinho.

Mas aconteceu o seguinte: eu tava querendo experimentar uma cerveja russa, então comprei uma indicada pel a Tânia naquela loja de conveniência embaixo do prédio dela. Daí chegando lá em cima, ela me falou: "Olha, é isso que os homens russos comem quando tomam cerveja", e tirou de um saco plástico que estava guardado numa gaveta dois peixes pequenos secos e salgados, mas ainda com escama, cabeça, tudo! Eu olhei praquilo e perguntei como comia e ela me mostrou o jeito certo, que era tirar pequenos nacos do corpo do peixe e deixar o rabo e a cabeça pra lá. Achei meio estranho comer peixe assim, mas até que deu um tira-gosto legal.

Logo em seguida, ela abriu a geladeira e tirou um pedaço de uma coisa branca e botou num prato. Eu perguntei o que era aquilo e ela me disse que era gordura de porco. Daí eu pensei: "Ah, claro, ela deve fritar isso e deve ficar parecido com uma pururuca, sei lá", mas ela simplesmente pegou a gordura com a mão e deu uma mordida gigantesco no negócio. Cru, assim, sem mais nem menos. Ela me ofereceu e eu venci o asco e dei uma bitoca também. Acreditam que era até gostoso o negócio? Meio nojento, mas gostoso.

Mas o principal mesmo eram as sementes de abóbora. Tinha um saco cheio disso, e a gente ficou comendo sem parar durante horas. Até que de repente ela botou uma na boca, parou de falar e entrou pra dentro do quarto e começou a falar em russo no telefone. Daí fomos descobrir que ela havia quebrado o dente da frente abrindo a semente (isso se come igual a um pistache, mais ou menos). Ela havia decidido então ir para a cidade natal dela, Nizhniy Novgorod, para se tratar com um dentista conhecido, e já havia inclusive ligado para o seu chefe na OMS (o Luigi da foto) e dito que iria faltar ao trabalho no dia seguinte.

E foi assim que a gente se agilizou. Ela partiu na mesma noite de trem pra sua cidade após explicar 10 mil vezes como chegar no aeroporto e nós dormimos sozinhos pela última vez na casa dela. Saímos bem cedo, trancamos a porta e jogamos a chave fora; acho que ela tinha mais umas duas ou três cópias. Daí fomos pro aeroporto sem nenhum problema, e de lá pegamos nosso vôo pra Polônia, de volta à União Européia.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Interrupção

Ola caros leitores do blog!

Infelizmente, um pequeno imprevisto aconteceu e por isso vai ficar dificil pra gente atualizar o blog de agora em diante. Nao eh nada serio, a viagem continua, soh o blog que vai ficar esquecido por um tempo, mas pretendemos completar tudo assim que voltarmos para BH.

Resumindo: voltem daqui a um mes, hehehe :)

Beijos e abraços,

Digo e Bela

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Dia 34 e 35 - São Petersburgo

17 e 18 de outubro

Rússia, Rússia, Rússia. Esse nome sempre soou tão distante nas aulas de História ou nas notícias de TV que talvez nunca nem passou pela nossa cabeça que um dia poderíamos ir para lá.

Mas fomos. E podem começar a se preparar porque temos muita coisa pra contar.

Mapa

Bom, vale a pena aqui gastar um tempinho a mais detalhando todo o sofrimento pelo qual um turista tem que passar para visitar esse país. Vamos enumerar, para ficar tudo mais simples:

1) Um visto!!! Apenas cidadãos das ex-repúblicas soviéticas como Belarus, Ucrânia e Cazaquistão não precisam de visto para entrar na Rússia. Ou seja, nós, brasileiros, podemos entrar sem visto na Inglaterra, Alemanha, França, Suécia, Noruega, mas não na Rússia. Mas além disso, esse visto não é um visto normal, porque para conseguir ele você precisa (além de pagar uma taxa de 150 doletas) de uma...

2) Carta convite!!! Essa é uma maneira que os russos conseguiram para ganhar mais grana em cima do pessoal. Você é obrigado a pagar mais 40 dólares pra uma das trilhões de agências que existem na Rússia só para emitir carta-convites. Mas não é aí que termina a burocracia, pois aindia é necessário...

3) Registrar o visto!!! É, em menos de 3 dias desde sua chegada ao país você é obrigado a ter o visto registrado, caso contrário você pode ser preso ou obrigado a pagar uma multa de mais 150 doletas. Reminescências do antigo estado soviético, KGB e etc, provavelmente. E como faz pra registrar o visto? Essa é uma boa pergunta, já que na Rússia você tem que lidar com o fato de que...

4) Ninguém fala inglês!!! Tipo, tá certo que ninguém é obrigado a saber nenhuma língua estrangeira, mas lá nem mesmo aquele pessoal que você tem certeza que falaria fala, como por exemplo balcão de informação do aeroporto ou pasmem, até o agente de imigração. Tentamos perguntar para ele como fazia pra registrar o visto e o cara quase tomou nossos passaportes e não deixou a gente entrar no país. E esse não é o único problema de comunicação pelo qual tivemos que passar não, pois lá na Rússia...

5) O alfabeto é diferente!!! Imaginem só a situação: dois brasileiros vão de Estocolmo a São Petersburgo com escala em Moscou, no aeroporto Sheremetyevo. Chegando no primeiro destino, eles descobrem através da moça do balcão da companhia aérea que parcamente falava inglês que o terminal internacional é separado do doméstico, e que eles teriam que pegar um ônibus que nos levasse até o outro. Parece fácil, mas alguém aí sabe como se escreve Sheremetyevo em russo? Шереметьево. Pois então, ficamos perdidinhos, tentando achar algo parecido com isso nas placas do ponto de ônibus enquanto dezenas de motoristas de táxi e vans particulares ficavam enchendo o saco, e isso tudo aguentando o frio de neve (é isso mesmo, Moscou estava coberta de neve quando chegamos).

É claro que nessa confusão toda, acabamos perdendo o nosso vôo pra São Petersburgo. Mas no final das contas, acabamos dando conta de pegar um outro no mesmo dia, de tomar o ônibus certo que saía do aeroporto pra estação do metrô e de chegar no albergue são e salvos. Nessa primeira caminhada noturna que fizemos até lá já deu pra sentir o clima da cidade:

Avenida Nevskiy Prospect à noite

É, o centro de São Petersburgo é lindo, muito mais do que poderíamos ter imaginado. E o melhor, sem neve. No outro dia de manhã, quando fomos passar, descobrimos que essa Nevskiy Prospect é a avenida principal da cidade, a mais larga e a mais bonita também.

Ela de dia

E ao vencedor, as batatas

Ela é bem comprida, e corta todo o centro de São Petersburgo até o Rio Neva. Depois de cruzarmos alguns canais e várias outras redes de fast-food americanas, chegamos no nosso primeiro destino turístico: a Catedral Kazan.

Na hora não sabíamos, mas depois fomos descobrir que existem várias outras catedrais com o mesmo nome espalhadas pelo país. A explicação é que Kazan era a antiga capital do reino tártaro, e quando os russos finalmente dominaram a região o czar mandou construir pelo menos uma em cada cidade importante para comemorar sua vitória.

Essa de São Petersburgo era bonita por fora...

Catedral Kazan

...mas o que vimos lá dentro foi inacreditável. Entramos bem no meio da missa, e podemos afirmar que nunca esqueceremos do momento em que vimos pela primeira vez o culto da Igreja Ortodoxa.

Abre parênteses: a Rússia também é cristã, mas não é católica romana nem protestante, é ortodoxa. Quando o Império Romano se dividiu, a parte ocidental (que hoje é França, Alemanha, Espanha, etc) se desintegrou rapidamente, mas a oriental (Turquia, Grécia, Bulgária, etc) continou existindo por mais um milênio. E foi nessa parte que a religião ortodoxa se desenvolveu, e de lá se espalhou para a Rússia.

Lá dentro não era permitido tirar fotos, mas nós também nem nos atreveríamos. A cena parecia mágica, e cremos que só quem também já viu uma missa ortodoxa sabe do que estamos falando. Não é um padre que dá o sermão; são vários, divididos em vários grupinhos espalhados pela igreja comandados pelo sacerdote principal, que fica no altar. E o sermão não é falado, é cantado, e é impossível achar palavras para descrever a beleza desse canto. O som vinha em inúmeros tons e de vários lugares diferentes, e enquanto um grupo parava de cantar, o outro começava, e isso deixava qualquer um emocionado. Depois ficamos saber que cada culto dura cerca de 3 horas, e em tempo algum os sacerdotes param de cantar.

A atmosfera de dentro da Igreja também era fascinante. Tudo é marrom e dourado, e não existem bancos ou estátuas, apenas imagens e pinturas nas paredes que ficavam ainda mais douradas com o tremular das velas que as senhoras russas vinham acender. Enquanto os sacerdotes cantavam, uma quantidade absurda de velhinhas caminhava prum ladro e pro outro, beijando cada um dos símbolos, encostando a testa, fazendo em-nome-do-pai, ajoelhando-se no chão e dobrando o corpo em reverência. E isso acontecia por toda a igreja, com gente entrando e saindo sem parar, já que não é costume deles assistir as três horas de culto mas apenas dar uma passada e ficar ali por alguns minutos.

Saímos de lá atordoados, e foi só voltar para a Nevskiy Prospect que demos de cara com a construção mais bonita que vimos em toda São Petersburgo:

Igreja do Salvador no Sangue

Parece um brinquedo de criança, não é mesmo? Diz Ricardo que as torres são feitas de maria-mole, hehehe. Mas que é lindo é. E como foi a primeira igreja desse tipo que vimos na Rússia ficamos completamente boquiabertos. A gente foi andando na direção dela, e quanto mais perto chegávamos mais impressionado ficávamos.

Ela, de pertinho

Sua construção é recente, data do século XIX mesmo. E uma história curiosa: durante a época do comunismo, o ateísmo oficial propagado pelo Estado fez com que essa igreja fosse usada por mais de 40 anos como depósito para vegetais. O nome em português parece esquisito, mas pelo que pesquisamos deve ser esse mesmo.

Nos dois dias e meio que passamos em São Petersburgo nós tentamos entrar nessa igreja, mas foi só no último que descobrimos que estava fechada por algum motivo obscuro (o\ papel tava em russo somente! sem tradução!) exatamente nesses três mesmos dias... É uma pena, pois lemos no nosso guia que dentro dela está o maior mosaico do mundo.

Mas sei lá, acho que também já nos contentamos em só a contemplar do lado de fora mesmo :)

Ela, do outro lado

Continuamos nosso passeio seguindo a Nevskiy Prospect até o final, onde ela termina bem em frente à Catedral de São Isaac.

Catedral de São Isaac

O prédio é enorme e bonito, mas depois de vermos a Igreja do Salvador no Sangue pareceu meio normal demais, talvez. A arquitetura é estilo romano, igual à Catedral Kazan que visitamos mais cedo, e o prédio foi construído no meio do século XIX. Não sei se dá pra ver direito pela foto, mas reza a lenda que domo dourado é ouro puro, quase 100 kilos.

Dava pra entrar lá dentro e subir na torre pra ver a cidade, mas incrivelmente e por um motivo quiçá mais obscuro ainda ela também estava fechada pelos três dias que estávamos na cidade

Ali do lado ficava o Palácio de Inverno da realeza russa, na época em que a capital era São Petersburgo (entre 1703 e 1917). Agora é hora de testar o conhecimento histórico de novo: alguém aqui sabe que praça é essa?

Praça do Palácio

Foi exatamente nesse local que três grande reviravoltas na história russa aconteceram. Primeiro, no século XVIII, Catarina a Grande deu um golpe de estado e derrubou o czar Pedro III, seu marido. Depois, em 1905, Nicolau II ordenou um massacre dirigido a operários que manifestavam nesse mesmo local no que hoje é conhecido como "Domingo Sangrento".

Esse massacre antecipou a revolução de 1905, e foi aqui também que em 1917 Lenin e seus bolcheviques tomaram o poder e começaram a Revolução Russa, que transformou o país em socialista e transferiu a capital para Moscou.

No Palácio de Inverno, que fica bem ali atrás, hoje existe o Hermitage, que é simplesmente a maior coleção de obras de arte do mundo. Tudo começou com 255 quadros comprados por Catarina A Grande, e hoje o Hermitage possui mais de 3 milhões de peças, das quais apenas 5% ficam expostas de cada vez.

Palácio De Inverno, onde fica o Hermitage

É óbvio que entramos lá dentro, e a entrada é deliciosamente grátis para estudantes. E é óbvio que gastamos o resto da tarde percorrendo uma infinidade de salas, corredores, quartos, halls e etc.

E também deve ser óbvio que era proibido tirar foto lá dentro, mas podem ter certeza que o passeio foi ótimo. Além de obras de Da Vinci, Michelangelo e de vários outros artistas ocidentais e russos, o Palácio ainda exibia quartos decorados exatamente como eram na época em que ele ainda era um palácio, e eles eram simplesmente incríveis.

Assim acabou o nosso primeiro dia, gastos até o talo.

No segundo, aproveitamos a manhã para caminhar até o outro lado do rio Neva até a Fortaleza de Pedro e Paulo. No caminho, passamos por uma mesquita, que era um prédio todo diferente, bem bonitão.

Mesquita

Se ela tem nome ou não tem, não sabemos. Fomos lá para tentar olhar e um pessoal começou a perguntar coisa pra gente em árabe, então simplesmente desistimos e continuamos em direção à Fortaleza.

Essa foi a primeira pegadinha que encontramos na Rússia. O lugar parecia ser bem legal, mas chegando lá descobrimos que não passava de uma fortaleza mesmo, cheias de barracas militares sem graça. O único prédio talvez mais bonitinho era a Catedral de Pedro e Paulo, que supostamente guarda os restos mortais de Pedro O Grande, o czar que construiu São Petersburgo.

Catedral de Pedro e Paulo

Mas o mais legal mesmo foi caminhar até lá. As ruas de São Petersburgo são lindas, sem exceção. Pra cada canto que você olha dá a sensação de ter achado uma foto perfeita.

Em São Petersburgo

Passamos por vários parques também no caminho. Era legal observar as pessoas, já que os russos são diferentes e se vestem diferentes do que qualquer outro povo na Europa. Talvez esse fato tenha sido o mais legal de ter ido na Rússia, mas só fomos descobrir isso mesmo em Moscou. Mas isso é assunto pra depois.

Pessoal no parque

Uma outra coisa que chamava a atenção sempre que andávamos era o jeito que a galera estacionava os carros. Os russos paravam de qualquer jeito, enfiando metade do carro no passeio e deixando a outra metade no meio da rua. E durante todo esse tempo que andamos por lá, não vimos sequer uma placa de proibido estacionar.

Baliza pra eles não existia; tinha carro em cima do passeio, a 4 metros do meio fio, virado em 45 ou 90 graus, tudo sem fazer sentido nenhum. Mas é isso aí, viver bem é viver simples, não é mesmo? :D

Baliza, pra quê?

Da fortaleza, preferimos voltar usando o metrô. O metrô dessa cidade é muito engraçado. É tudo meio velho, como se o lugar fosse construído no início do século e nunca mais reformado. Talvez foi isso mesmo que aconteceu, vai saber. Tem até ascensorista de escada rolante, uma tiaziha que fica numa cabine fazendo sei lá o quê.

Dizem que o metrô de São Petersburgo é o mais profundo do mundo. Se é verdade não dá pra afirmar, mas que parece parece.

O metrô

Fomos parar ao lado do Monastério de Alexander Nevskiy. Esse monastério ainda está em atividade, e ainda é até hoje um dos mais importantes locais de peregrinação dos fiéis russos. A entrada era linda.

Entrada do Monastério

Do lado de dentro existem várias igrejas, mas todas bem mal cuidadas, quase caindo aos pedaços. Tinha um pessoal restaurando quase metade do lugar, mas ainda tava meio mais ou menos. O mais bonito mesmo eram os jardins e o monastério em si.

O monastério e uma das igrejas restauradas

Lá também haviam dois cemitérios, um das personalidades (onde estão enterrados o escritor Fyodor Dostoevsky e o músico Tchaikovsky, dois são-petersburguenses de renome) e outro dos comuns. O preço pra entrar entrar no dos famosos era absurdo, quase 10 dólares, e como cemitério é tudo igual mesmo, demos uma olhada no dos normais.

Nós vimos vários símbolos esquisitos e diferentes, incluindo até uma estrela vermelha do comunismo. Mas o que mais se repetia era a cruz ortodoxa:

Túmulo e cruz ortodoxa

Depois disso, ficamos passeando pelos parques e observando o pessoal. Tinha um chamado Campo de Marte, literalmente, e lá havia uma chama eterna em homenagem aos soldados russos mortos na Segunda Guerra. Do lado ficava os Jardins de Verão, um parque meio fechado e escuro que ficava bem na frente do Palácio de Verão.

Ficamos procurando esse Palácio de Verão por quase uma hora, já que o guia indicava esse lugar como ponto turístico. Mas tava meio difícil de achar, então ficamos rodando e rodando dentro do parque até chegar na segunda e maior pegadinha do dia.

O "grandioso" Palácio de Verão

Esse palácio foi decepcionante, mas óbvio que nem chegou perto de estragar o nosso passeio por São Petersbugo. Depois, fomos descobrir que essa cidade havia sido fundada por Pedro o Grande como sua "janela para o oeste". Por isso, ele contratou vários arquitetos e paisagistas ocidentais (franceses, principalmente) para construir os palácios e os prédios do centro que hoje é histórico.

Por isso achamos que em São Petersburgo faltou aquele toque "russo" como esperávamos que ia ser. Isso acabamos encontrando em Moscou, onde passamos três dias que iremos contar a seguir.

Mas por favor, não pensem que não gostamos de lá não. Achamos a cidade maravilhosa e impressionante, tanto pelas suas construções como pelo pouco que conhecemos do seu povo e da sua história.

Adeus, São Petersburgo

Da estação, nos despedimos da cidade e pegamos o trem noturno para a capital, 600 quilômetros ao sul.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Dia 33 e 34 - Estocolmo

15 e 16 de outubro

Se já era legal o fato de que a capital da Dinamarca ficava numa ilha, imagine então a da Suécia, que é totalmente constituída por um arquipélago de meros cinquenta e dois pedaços de terra boiantes interligados por centenas de pontes de pedestre, carro e trem em todas as direções.

Sentiu o drama? Pois então, assim é Estocolmo.


Exibir mapa ampliado

Estocolmo foi a terceira e última cidade que nós visitamos na Escandinávia, e talvez a nossa favorita. Essa história das ilhas não é brincadeira não; seus 1 milhão e 300 mil habitantes têm que conviver com a rotina diária de cruzar um punhado de ilhas para ir a qualquer lugar. Dá só uma olhada:

Labirinto de pontes conectadas ao centro histórico

Nossa primeira alegria em Estocolmo foi o nosso albergue. Como uma imagem vale mais do que mil palavras, vai aí uma foto do lugar onde ficamos:

Nosso albergue

Sim!! Um barco!! Hahaha, foi realmente uma experiência legal dormir dentro de um lugar desses, mesmo considerando o calorzão abafado que fazia dentro do quarto. Toda a decoração era a rigor, e o melhor era que janela dava pro mar.

O interior

O legal disso tudo é que esse albergue ficava o mais próximo possível da ilha de Staden, a mais interessante de Estocolmo por ser onde ficava o centro histórico (Gamla Stan, em sueco).

É óbvio que tudo fica mais bonito quando você está dormindo num barco no meio da cidade, mas o Gamla Stan era realmente espetacular.

Orla do Gamla Stan

Foi principalmente esse centro histórico que fez a gente gostar tanto dessa cidade. Para ir para todos esses lugares que turista vai, ou você via o Gamla Stan de longe ou você tinha que passar por dentro dele, o que era igualmente lindo. Se não fosse pelas centenas de lojas de souvenir e pelas outras centenas de turistas que cruzavam as ruelas históricas, dava até a impressão que o tempo tinha parado há séculos.

Lá dentro

Em outra rua

Os pontos turísticos de verdade no Gamla Stan são poucos, já que a ilha era pequena e tudo que tinha lá era espremido pra caber mais coisa. Tinha uma praça bonitinha chamada Stortorget, cheia de prédios estilo Bruges e banquinhos pro pessoal sentar.

Stortorget

Meio quarteirão pro norte ficava o Palácio Real, ou Kungliga Slottet. Ele foi construído em 1754, e até hoje é a residência de inverno da família real sueca (é isso mesmo, a Suécia é uma monarquia também). O Kungliga Slottet está no rol dos maiores palácios de toda a Europa, e não é por menos que ele é a construção mais imponente por ali.

Kungliga Slottet

Por hironia do destino, chegamos lá bem na hora da Troca da Guarda sem saber de nada. Só vimos um monte de japa amontoado na frente dos guardinhas e aí que fomos descobrir.

Essa foi mais legal do que a de a de Londres, talvez pelo simples motivo que conseguimos enxergar o que estava acontecendo (em Londres isso era absolutamente impossível, devido à quantidade de gente pendurada nas grades tentando tirar foto). Mas que mesmo assim foi uma besteirada pra quem não tem nada o que fazer isso foi, hehehe.

A troca da guarda sueca

Ficamos andando por ali um tempo, e depois decidimos explorar as ilhas adjacentes. De um lado, nas pequenas Skeppesholmem e Kastellholmen (holmem é ilha em sueco, ou pelo menos parece ser), encontramos uma igrejinha e uma espécie de castelo. Dos dois, a igreja era a mais bonita.

Igrejinha em Skeppsholmen

Do outro lado, encontramos o que talvez seja a menor ilha do mundo! Não sabemos quem é o dono desse prédio, mas que deve ser legal ter uma ilha bem no meio da capital da Suécia só pra você ninguém pode negar :)

Um prédio solitário

Do lado desse prédinho, em Riddarholmen (Ilha do Rei, em sueco), fica a Riddarholmskyrkan. A história dessa igreja é legal: sua parte mais antiga foi construída no século 13 por monges franciscanos e ela se tornou luterana após a Reforma Protestante, mas durante todo esse tempo ela vem sido o local de enterro da realeza sueca. Praticamente todos os monarcas desde 1290 até 1950 foram enterrados lá.

Riddarholmskyrkan

A igreja estava fechada para visitação, mas isso pouco importou. O mais legal mesmo era continuar admirando o Gamla Stan desse outro lado da cidade.

Gamla Stan, mais uma vez

Numa das ilhas maiores, chamada Kungsholmen, fica o prédio da prefeitura (Stadshuset). Por fora, o prédio é grandioso, mas não muito ornamentado. É lá que ocorre todo ano o banquete de entrega do Prêmio Nobel.

Stadshuset

Entramos lá dentro, e o mais impressionante mesmo era a vista em direção ao mar e às outras ilhas que talvez foi a mais bonita do dia.

Estocolmo, ahhh Estocolmo...

Um pouco mais ao norte encontramos o grande centro comercial da cidade, uma praça chamada Sergels Torg. Ela foi construída logo após o término da Segunda Guerra Mundial, numa tentativa de planejadores urbanos modernistas de criar um marco central pra cidade, como se fosse uma espécie de Praça Sete.

Hoje a Sergels Torg está cheio de lojas e prédios espelhados, e um obelisco de vidro de 37 metros de altura caracteriza o local.

Sergels Torg

Também é legal conhecer esse outro lado mais moderno da cidade, que em Estocolmo fica completamente separado da parte histórica. Talvez o ponto de ligação mais emblemático entre esses dois mundos seja uma rua de pedestres chamada Drottninggatan.

A Drottninggatan começa ao norte na própria Sergels Torg, e vai descendo em direção ao sul entre grandes prédios comerciais e tendas de souvenirs até atravessar os belos arcos do Parlamento sueco (Riksdag), chegando assim na ilha de Staden e no Gamla Stan.

Final da Drottninggatan

E o nosso relato sobre Estocolmo em geral acaba aqui. Não sabemos se conseguimos transmitir direito a nossa sensação em relação a cada cidade que visitamos na Escandinávia, já que só ficar vendo as fotos mais bonitas não é a mesma coisa de passar o dia inteiro passeando pelas ruas e vendo as pessoas. Talvez isso explique porque achamos Dublin sem graça mas vários comentários falavam que ela parecia ser linda, já que vocês só viram as fotos dos lugares mais bonitos, não é verdae?

Justamente por isso podemos dizer que gostamos das três, mas de Estocolmo em especial. É incrível a beleza do Gamla Stan, e também a sua posição em relação ao resto da cidade. Onde quer que estivéssemos, estávamos sempre de frente para um tanto de prédios históricos, pintados e charmosos na beira do mar. Acho que a nossa lembrança da Suécia vai ser exatamente essa, mais ou menos como mostra essa foto:

A última lembrança

De Estocolmo, partimos para a velha e fria Rússia. Mais detalhes no próximo capítulo...

domingo, 28 de outubro de 2007

Dia 32 - Oslo

14 de outubro

Depois de atravessar o Mar Báltico e metade da Suécia de trem, finalmente chegamos em Oslo.


Exibir mapa ampliado

Oslo é a capital da Noruega, e a menor das três que iríamos visitar na Escandinávia. A população total é cerca de 600 mil habitantes, todos loirinhos e branquinhos como todo bom e velho norueguês, não é verdade?

Não!!! Chegamos na cidade à noitinha, lá pelas 8 da noite, e fomos caminhando da estação de trem até o albergue. No nosso caminho de cerca de 20 minutos, o que mais nos chamou atenção foi a quantidade de imigrantes que encontramos e a de branquelos que não encontramos. Depois fomos saber que quase 30% da população de Oslo é imigrante, sendo que a maioria é de origem indiana, paquistanesa e africana.

Mas a mais agradável surpresa foi quando fomos comprar nosso primeiro lanche em terras norueguesas. Já ouvimos dizer várias vezes que Paris é a cidade mais cara da Europa, mas depois de Oslo tá difícil acreditar. Fomos no lugar mais barato que o guia nos indicava, uma lanchonete fulerinha comandada por dois indianos. Pedimos um x-burger, um sanduíche de carne picotada (o famoso kebab) e uma coca, que saíram pela bagatela de 120 coroas (aproximadamente 12 euros, ou um pouco mais de 25 reais). E olha que nem foi em zona turística, foi no meio de um bairro residencial e num dos lugares mais baratos da cidade.

Bom, mas não nos deixamos desanimar por meras questões financeiras e fomos passear bem cedo no outro dia. Como Oslo é pequena, a maioria dos pontos turísticos fica perto um dos outros, e fizemos tudo andando mesmo.

O primeiro lugar que fomos foi o Castelo e Fortaleza de Akershus.

Ruas calçadas do lado de fora da muralha

Akershus fica bem na beira do mar, na entrada do porto principal da cidade. A fortaleza foi construída ali em pleno século XIII, e com o crescimento do império viking acabou sofrendo uma ampliação e dando lugar a um grande castelo. Em 1624, um incêndio acabou queimando tudo e o complexo foi reconstruído como um palácio renascentista.

Torre e paredes internas

O lugar é bem grande e bem bonito, tudo construído num estilo rústico que combinava perfeitamente com a vegetação do local. Aliás, era essa segunda o que mais se destacava, graças à linda coloração típica do outono. Olha só:

O outono, em Akershus

De lá, caminhamos pelo centro da cidade até o Palácio Real. Oslo não tem um centro histórico ou Old Town separado, mas a beleza das ruas da região central mais do que compensa.

Alguma rua no centro de Oslo

Prédio do Parlamento (Stortinget)

O Palácio Real fica no meio de um parque chamado Slottsparken, no coração da cidade. A caminhada até lá foi bonita mas o palácio em si não tem nada de mais. O pior mesmo era a terra marrom bem na frente do prédio. Custava plantar uma graminha?

Subindo em direção ao Palácio

O dito cujo

Saindo do Palácio, fomos aproveitar o fato de que era domingo e visitamos dois museus - que em Oslo são de graça nesse dia da semana. O primeiro e mais legal foi a Galera Nacional de Arte (galeria é museu?), que exibe vários quadros e esculturas famosas, desde Monet até Picasso, passando por Van Gogh e talvez pelo único pintor noruguês de renome internacional, Edvard Munch.

Talvez seja difícil lembrar só pelo nome, mas é dele aquele famoso quadro "O Grito", que estava exposto na galeria.


O segundo museu foi o Museu da História Norueguesa. Esse prometia pelo nome, mas acabou decepcionando no final das contas. As exibições eram bem mixurucas, e a grande maioria dos textos estavam apenas em norueguês. Foi meio pegadinha, digamos assim.

Susposto traje dos reis Vikings

Mas não se desesperem, pois a melhor parte de Oslo ainda estava pra chegar. Caminhamos uns vinte minutos para chegar no belíssimo Vigelandsparken, um parque de esculturas idealizado e criado pelo artista norueguês Gustav Vigeland (1869 - 1943).

Vigelandsparken

O parque tem mais de 200 esculturas em menos 80 acres, cada uma representando um estágio do ciclo de vida humano. Todas foram criadas e posicionadas pelo próprio Vigeland. O lugar é simplesmente magnífico.

Umas das centenas de esculturas do parque

O mais legal é como esse cara conseguiu dar tanta beleza a cenas tão normais do dia a dia. O movimento e a emoção presente em cada uma das obras é impressionante. Também é legal como tudo ficava tão mais bonito com a vegetação de outono ao fundo.

Outra

Bem no meio do parque fica um enorme monolito de corpos amontoados, e ao redor outras dezenas de esculturas que tinham como tema a relação entre pais e filhos. Dava vontade de parar e ficar meia hora em cada uma, sem exagero.

Monolito

Mãe

Mais duas

No final do dia, fomos dar uma passeada pelo porto, que é cheio de lojas meio carinhas e restaurantes. A vista é bonita, mas o que mais chama atenção é o Castelo Arkeshus (aquele onde passeamos pela manhã), que fica bem ali do outro lado.

Porto

Arkeshus, visto de longe

Assim nos despedimos de Oslo, e partimos no trem noturno para nossa última cidade escandinava...